Em busca do espaço/tempo ganho no
Brasil
Texto de Jorge Vital de Brito Moreira
Parte 4
Escrevi (no texto da semana passada, na parte
3), que tinha regressado a
Salvador para reencontrar,
o meu irmão mais moço, Carlos Roberto (Carlinhos), para logo, juntos,
empreendermos uma segunda viagem que seria realizada por ferry-boat e por automóvel.
O objetivo da viagem era atravessar a
ilha de Itaparica e incluiria, no primeiro dia,
o porto de Bom Despacho (lugar de chegada e saída dos Ferry-Boats) e uma
visita demorada a cidade de Mar Grande, lugar de nascimento da nossa mãe, um
espaço onde teríamos de encontrar e conversar com muitos parentes e contraparentes
do lado materno. Depois fizemos uma curta e rápida visita a localidade do
Jaburú.
Quanto a cidade de Mar Grande (o local
meus avós maternos e meus tios viviam e lugar preferido para nossa família veranear),
mudou completamente durante os anos que tenho vivido nos EUA,. Felizmente,
escrevi (há 8 anos) um livro de memorias
intitulado Memorial da Ilha e Outras
Ficções para monumentalizar as
minhas experiências no Mar Grande daquele tempo. Acredito que foi uma
afortunada decisão ter escrito um romance sobre aquele maravilhoso lugar para
registrar aspectos importantes da minha história (pessoal e coletiva), da minha
infância, e da minha adolescência, e, em
geral da historia da ilha nesta época, entre os anos 50-60.
Atualmente, o Mar Grande que acabamos
de visitar, me pareceu um lugar estranho, ruidoso e pouco interessante. A
cidade cresceu e a sua população aumentou. Mas a cidade cresceu pra baixo, como
um rabo de cavalo, perdendo a especial qualidade que a projetava como uma área
tranquila; e um espaço privilegiado para se viver e veranear. Hoje, Mar Grande parece
um mundo desordenado e caótico, habitado, principalmente, por uma população
formada por gente pobre, sem recursos, sem educação, sem trabalho permanente, e
sem futuro promissor. E para piorar, as melhores casas e construções de
antigamente foram transformadas em lugares comerciais, cheios de restaurantes,
bares, bebados e casas de negócios.
A viagem de automóvel Chevrolet do meu
irmão Carlinhos, também incluiu, no primeiro dia, hospedagem e dormida na cidade de Itaparica. No
dia seguinte fizemos uma visita prolongada a esta belíssima cidade histórica,
onde minha família teve uma casa de veraneio onde nós passávamos o verão,
quando a nossa família não estava veraneando na nossa casa do Mar Grande.
Da nossa grata visita a cidade de
Itaparica poderia mencionar alguns lugares e momentos muito agradáveis: a Pousada Muito Mais onde nos hospedamos,
a padaria, perto da Pousada, onde tomamos o nosso café da manhã, o passeio
pelas ruas de pedras da cidade, as vistas panorâmicas desde o longo quebra mar
da Avenida Vinte Cinco de Outubro, as praças publicas, a Praça Getúlio Vargas,
o forte São Lourenço e sua praia, a casa do finado escritor João Ubaldo
Ribeiro, as igrejas antigas (como a Igreja da Matriz), as mansões coloniais, o
Hotel Itaparica e muitas outras maravilhas.
Saindo de Itaparica, Carlinhos e eu, fomos de
carro para os lugarejos de Ponta de Areia, de Amoreira, de Porto do Santo, para
logo voltar ao porto de Bom Despacho. Neste porto, almoçamos num restaurante de
comida a quilo (uma das coisas mais gostosas que se inventou nas cidades
brasileiras), para depois tomarmos a rodovia que nos conduziu a vila de Caixa
Prego (atualmente este lugar que me deixou muito a desejar). Saindo de Caixa
Prego, passamos pelas localidades de Berlinque, Tairu, Barra Grande, Conceição
e Barra do Pote.
A visita a Barra do Pote foi excelente
e muito proveitosa pois tomamos um gostoso banho de mar no final da tarde, para
em seguida, jantarmos uma deliciosa moqueca de povo e lagosta num ótimo
restaurante local. De noite, nos hospedamos e dormimos na Pousada Beira Mar, a
melhor pousada que tivemos a
oportunidade de conhecer na Ilha de Itaparica.
No dia seguinte, fomos visitar as
localidades da Barra do Gil e da Penha, além do Club
Méditerranée, também conhecido como Club Med. A Penha e a sua
praia continuam limpas e muito bem conservadas; ainda são muito agradáveis para
visitar e banhar-se nelas, porém, o Club
Méd, nos deixou decepcionados, pois a
nossa visita se converteu numa atividade sem sentido, sem vida e sem graça. Em
poucas palavras, o Club Med estava
completamente vazio, não tinha hospedes, não tinha turistas, nem tinha nada
interessante para ver. No fim da tarde
de este mesmo dia regressemos de Ferry boat a cidade de Salvador.
A viagem à Ilha de Itaparica teve altos
e baixos, com aspectos positivos e negativos. Um dos aspectos positivos da
viagem, foi o conhecimento que meu irmão Carlinhos possuía sobre o povo, as
costumes e os hábitos da pessoal que vive na ilha. Carlinhos, é um tipo alto,
claro, de olhos azuis e cabelos louros. Atlético e desportivo, Carlinhos, apesar
da idade, continua jogando futebol, pois além de ser um jogador importante
pelas qualidades técnicas, ele também é um sujeito apaixonado, como
participante e como observador, pelo jogo de futebol. No geral, meu irmão é uma
pessoa bem educada, amável e bondosa no relacionamento com diferentes tipos de
indivíduos, mas é especialmente generoso com as mulheres que o procuram (sobretudo
com as moreninhas). Aliás, ele sempre foi uma pessoa muito generosa (talvez até demasiado generosa, para um contexto de um
capitalismo selvagem ainda mais
miserável, desalmado e cruel que o dos países europeus e estadunidense).
Quando regressei da Ilha e cheguei a Salvador,
fiquei mais uma vez hospedado no apartamento da minha irmã Lucia (Licia),.
Neste apartamento, ela, o marido Carlos, os meus dois sobrinhos, Marcelo
e Murilo, e os seus dois netos Mikael e Luan, me proporcionaram (desde que
cheguei dos EUA) uma vida agradável e bem divertida. Sempre aproveitava as
instalações do moderno e bonito edifício onde minha irmã reside para usufruir
tanto da piscina como do equipado ginásio para fazer exercícios físicos..
Os meus familiares (o irmão Josafá, a
prima Marizete), os amigos, e os contraparentes que nos visitavam
frequentemente, também contribuíram para manter a minha estadia, numa vida movimentada
e muito sociável. Aproveito este texto para enviar a todos (principalmente a Lícia
e a sua família) os meus sinceros agradecimentos.
Também gostaria de registrar que estive tanto na manifestação política como no
comício contra o governo Dilma e do PT no Farol da Barra em Salvador. A
manifestação me surpreendeu pela ausência do povo brasileiro nas ruas. Quando me
encontrava no Farol da Barra para presenciar a divulgada “manifestação popular
contra o governo”, os únicos representantes do chamado “povão trabalhador” que
pude ver naquele comício, foram as vendedoras de Acarajé (as baianas), os
conhecidos vendedores de cerveja, de refrigerantes, de caldo de cana, e os
varredores de rua que trabalhavam para a prefeitura municipal da cidade. A
maioria das pessoas presentes no comício que presenciava, pertenciam (avaliando
pelo tipo de roupa fina com que desfilavam, pela amostra da raça luxuosa dos cães de
estimação que conduziam, pelos discursos frívolos e medíocres que emitiam,
pelas marcas dos telefones celulares, dos iPhones e dos iPods que exibiam),
pertenciam à denominada classe média
alta de Salvador. Essas pessoas usavam caras roupas esportivas de cor amarela e
verde, e cobriam-se com a bandeira da seleção brasileira, dando a impressão de
que estavam prontas para entrar num estádio de futebol e ver o time do Brasil
jogar naquela hora. Algumas dessas pessoas, com quem eu tive a oportunidade de conversar durante a
manifestação, viviam em edifícios luxuosos dos bairros grafinos (do Farol da
Barra, da Pituba, ou do Caminho das Arvores) da elite baiana, que eram
protegidos por guardas de segurança. Intelectual e politicamente, me pareceram
pessoas ingênuas, mal informadas ou ignorantes; apenas se revelavam como o que
realmente eram: indivíduos pretenciosos, arrogantes e medíocres. Aliás a
mediocridade foi a marca registrada da maioria das pessoas de classe media alta
que tive oportunidade de conversar em Salvador: era o que acontecia quase
diariamente enquanto realizava os exercícios de malhação no ginásio (gim) do
edifício onde me hospedava. No geral, essas pessoas me pareciam bem ignorantes:
estavam muito mal informadas e colonizadas pela media corporativa nacional e
internacional: a Globo TV, Fox news, CNN e muitas outras, que operam no Brasil para transformar nossa população numa massa de
imbecis consumistas, fetichistas, e alienados; dominados pela ideologia do sistema
capitalista neoliberal que impera por todo o Brasil.
Em resumo, a impressão que esta viagem pelas
cidades do sertão baiano-pernambucano me deixou foi que a realidade brasileira,
desde o ponto de vista estrutural, não conseguiu superar a situação de injustiça
sócio econômico que foram expressadas pela representação alegórica de Glauber
Rocha dentro de duas obras primas do cinema brasileiro: “Deus e o Diabo na
Terra do Sol” e “Terra em Transe”.
Quase a mesma coisa poderia dizer em
relação a minha percepção do aumento e da proliferação das favelas, da
marginalidade social, do trafico de drogas e da criminalidade na cidade de
Salvador; a impressão que tudo isso me deixou foi que a realidade brasileira
desde o ponto de vista da justiça sócio econômico ainda não pode superar a
representação realista de Fernando Meirelles da cidade do Rio de Janeiro, no
excelente filme “Cidade de Deus”
E
foi na cidade do Rio de Janeiro onde pude encontrar pela primeira vez o amigo
João (Jonga) Carlos Olivieri e sua bonita e querida esposa Virginia.
Quando o avião, procedente de Miami,
aterrissou no aeroporto Antônio Carlos Jobim, lá estava o amigo Jonga
esperando-me. Ainda que Jonga e eu tivéssemos estado nos comunicando
frequentemente através de e-mails e telefonemas EUA-Brasil durante muitos anos,
era a primeira vez que nos encontrávamos pessoalmente.
Nesse nosso primeiro encontro, Jonga
estava sem a esposa Virginia, e enquanto esperávamos pelo avião que me levaria
a cidade de Salvador, Jonga e eu (caminhando ou sentados nas lanchonetes e
restaurantes do aeroporto) conversávamos bebendo cafés, chocolates, ou
almoçando pra valer.
Quando voltei ao Rio para passar dois
dias visitando a cidade, aterrizei no aeroporto Tom Jobim e lá estavam o amigo
Jonga e a esposa Virginia esperando-me.
Durante os dois dias que passei no Rio, Jonga e Virginia me receberam com uma
grande amizade, com uma solidaria companhia e com uma cálida e tranquila
hospedagem
Não posso deixar de expressar meus
agradecimentos pela bela hospedagem e companhia que sua amizade me brindou.
Durante o pouco tempo que permaneci no Rio., eles me levaram para passear pelas
ruas da cidade. Na tarde da minha chegada, me levaram de ônibus e metrô para
passear. Depois de passar pela bela
lagoa Rodrigo de Freiras, fomos ao bairro de Copacabana para caminhar pela rua Nossa Senhora de
Copacabana, rever e apreciar a sua famosa praia do mesmo nome, desfrutar a
magnifica orla marítima da Avenida Atlântica e contemplar os famosos edifícios
e as espetaculares vistas como o panorâmicas (o Corcovado, o Cristo Redentor, o
Pão de Açúcar) da “cidade maravilhosa”. O Rio de Janeiro continua lindo.
No dia seguinte, eles me levaram a
passear pelo centro da cidade. Caminhamos pela Avenida Presidente Vargas, pela Cinelândia,
pela Avenida Rio Branco, onde pude rever os prédios antigos e famosos tais como
a Biblioteca Nacional, o Teatro Municipal, pude desfrutar de cafés,
restaurantes e das boas livrarias da cidade.
As 5 da tarde, tomamos
um taxi, para chegar ao Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim e abordar
o avião da Américan Airlines que me devolveria
ao aeroporto internacional de Miami. Sentado, junto aos amigos Jonga e Virginia,
no banco do aeroporto, dei-me conta de que ainda tinha na minha carteira, 172
reais que eram equivalentes, naquele momento, a
mais de 40 dólares no cambio oficial.
Sem tempo suficiente
para comprar umas lembrançinhas no aeroporto, fui ao Banco Safra para converter aqueles reais em
dólares. Resultado do intercambio naquele dia: o Banco Safra me entregou
apenas 25 dólares em troca dos 172 reais.
Em poucas palavras, fui roubado e saí do Brasil com a sensação de que nosso
país está completamente submetido à ditadura do capital financeiro. Em poucas
palavras, o nosso pais está submetido à máfia e a ladroagem oficial dos bancos
nacionais e internacionais, produtos de
um sistema sócio econômico capitalista que legitima taxas aterrorizantes de
juros contra o povo brasileiro.
E dentro do avião
estadunidense, que deixava a baia de
Guanabara, eu questionava indignado: até quando vamos tolerar que este
abominável sistema capitalista continue destruindo o nosso Brasil?