Sunday, October 25, 2015

Em busca do espaço/tempo ganho no Brasil - Parte 4


Em busca do espaço/tempo ganho no Brasil

Texto de Jorge Vital de Brito Moreira
Parte 4
Escrevi (no texto da semana passada, na parte 3), que tinha regressado a  Salvador para reencontrar, o meu irmão mais moço, Carlos Roberto (Carlinhos), para logo, juntos, empreendermos uma segunda viagem que seria realizada por ferry-boat e por automóvel.  
O objetivo da viagem era atravessar a ilha de Itaparica e incluiria, no primeiro dia,  o porto de Bom Despacho (lugar de chegada e saída dos Ferry-Boats) e uma visita demorada a cidade de Mar Grande, lugar de nascimento da nossa mãe, um espaço onde teríamos de encontrar e conversar com muitos parentes e contraparentes do lado materno. Depois fizemos uma curta e rápida visita a localidade do Jaburú.


Quanto a cidade de Mar Grande (o local meus avós maternos e meus tios viviam e lugar preferido para nossa família veranear), mudou completamente durante os anos que tenho vivido nos EUA,. Felizmente, escrevi (há 8 anos)  um livro de memorias intitulado Memorial da Ilha e Outras Ficções para  monumentalizar as minhas experiências no Mar Grande daquele tempo. Acredito que foi uma afortunada decisão ter escrito um romance sobre aquele maravilhoso lugar para registrar aspectos importantes da minha história (pessoal e coletiva), da minha infância, e  da minha adolescência, e, em geral da historia da ilha nesta época, entre os anos 50-60.
Atualmente, o Mar Grande que acabamos de visitar, me pareceu um lugar estranho, ruidoso e pouco interessante. A cidade cresceu e a sua população aumentou. Mas a cidade cresceu pra baixo, como um rabo de cavalo, perdendo a especial qualidade que a projetava como uma área tranquila; e um espaço privilegiado para se viver e veranear. Hoje, Mar Grande parece um mundo desordenado e caótico, habitado, principalmente, por uma população formada por gente pobre, sem recursos, sem educação, sem trabalho permanente, e sem futuro promissor. E para piorar, as melhores casas e construções de antigamente foram transformadas em lugares comerciais, cheios de restaurantes, bares, bebados e casas de negócios.
A viagem de automóvel Chevrolet do meu irmão Carlinhos, também incluiu, no primeiro dia,  hospedagem e dormida na cidade de Itaparica. No dia seguinte fizemos uma visita prolongada a esta belíssima cidade histórica, onde minha família teve uma casa de veraneio onde nós passávamos o verão, quando a nossa família não estava veraneando na nossa casa  do Mar Grande.
Da nossa grata visita a cidade de Itaparica poderia mencionar alguns lugares e momentos muito agradáveis: a Pousada Muito Mais onde nos hospedamos, a padaria, perto da Pousada, onde tomamos o nosso café da manhã, o passeio pelas ruas de pedras da cidade, as vistas panorâmicas desde o longo quebra mar da Avenida Vinte Cinco de Outubro, as praças publicas, a Praça Getúlio Vargas, o forte São Lourenço e sua praia, a casa do finado escritor João Ubaldo Ribeiro, as igrejas antigas (como a Igreja da Matriz), as mansões coloniais, o Hotel Itaparica e muitas outras maravilhas.
 Saindo de Itaparica, Carlinhos e eu, fomos de carro para os lugarejos de Ponta de Areia, de Amoreira, de Porto do Santo, para logo voltar ao porto de Bom Despacho. Neste porto, almoçamos num restaurante de comida a quilo (uma das coisas mais gostosas que se inventou nas cidades brasileiras), para depois tomarmos a rodovia que nos conduziu a vila de Caixa Prego (atualmente este lugar que me deixou muito a desejar). Saindo de Caixa Prego, passamos pelas localidades de Berlinque, Tairu, Barra Grande, Conceição e Barra do Pote.
A visita a Barra do Pote foi excelente e muito proveitosa pois tomamos um gostoso banho de mar no final da tarde, para em seguida, jantarmos uma deliciosa moqueca de povo e lagosta num ótimo restaurante local. De noite, nos hospedamos e dormimos na Pousada Beira Mar, a melhor pousada  que tivemos a oportunidade de conhecer na Ilha de Itaparica.
No dia seguinte, fomos visitar as localidades da Barra do Gil e da Penha, além do Club Méditerranée, também conhecido como Club Med. A Penha e a sua praia continuam limpas e muito bem conservadas; ainda são muito agradáveis para visitar e banhar-se nelas, porém, o Club Méd, nos deixou decepcionados, pois a nossa visita se converteu numa atividade sem sentido, sem vida e sem graça. Em poucas palavras, o Club Med  estava completamente vazio, não tinha hospedes, não tinha turistas, nem tinha nada interessante para ver.  No fim da tarde de este mesmo dia regressemos de Ferry boat a cidade de Salvador.
A viagem à Ilha de Itaparica teve altos e baixos, com aspectos positivos e negativos. Um dos aspectos positivos da viagem, foi o conhecimento que meu irmão Carlinhos possuía sobre o povo, as costumes e os hábitos da pessoal que vive na ilha. Carlinhos, é um tipo alto, claro, de olhos azuis e cabelos louros. Atlético e desportivo, Carlinhos, apesar da idade, continua jogando futebol, pois além de ser um jogador importante pelas qualidades técnicas, ele também é um sujeito apaixonado, como participante e como observador, pelo jogo de futebol. No geral, meu irmão é uma pessoa bem educada, amável e bondosa no relacionamento com diferentes tipos de indivíduos, mas é especialmente generoso com as mulheres que o procuram (sobretudo com as moreninhas). Aliás, ele sempre foi uma pessoa muito generosa (talvez até  demasiado generosa, para um contexto de um capitalismo selvagem ainda mais  miserável, desalmado e cruel que o dos países europeus e estadunidense). 


Quando regressei da Ilha e cheguei a Salvador, fiquei mais uma vez hospedado no apartamento da minha irmã Lucia (Licia),. Neste apartamento,   ela, o marido Carlos, os meus dois sobrinhos, Marcelo e Murilo, e os seus dois netos Mikael e Luan, me proporcionaram (desde que cheguei dos EUA) uma vida agradável e bem divertida. Sempre aproveitava as instalações do moderno e bonito edifício onde minha irmã reside para usufruir tanto da piscina como do equipado ginásio para fazer exercícios físicos..
Os meus familiares (o irmão Josafá, a prima Marizete), os amigos, e os contraparentes que nos visitavam frequentemente, também contribuíram para manter a minha estadia, numa vida movimentada e muito sociável. Aproveito este texto para enviar a todos (principalmente a Lícia e a sua família) os meus sinceros agradecimentos.


Também gostaria de registrar que  estive tanto na manifestação política como no comício contra o governo Dilma e do PT no Farol da Barra em Salvador. A manifestação me surpreendeu pela ausência do povo brasileiro nas ruas. Quando me encontrava no Farol da Barra para presenciar a divulgada “manifestação popular contra o governo”, os únicos representantes do chamado “povão trabalhador” que pude ver naquele comício, foram as vendedoras de Acarajé (as baianas), os conhecidos vendedores de cerveja, de refrigerantes, de caldo de cana, e os varredores de rua que trabalhavam para a prefeitura municipal da cidade. A maioria das pessoas presentes no comício que presenciava, pertenciam (avaliando pelo tipo de roupa fina com que desfilavam,  pela amostra da raça luxuosa dos cães de estimação que conduziam, pelos discursos frívolos e medíocres que emitiam, pelas marcas dos telefones celulares, dos iPhones e dos iPods que exibiam), pertenciam  à denominada classe média alta de Salvador. Essas pessoas usavam caras roupas esportivas de cor amarela e verde, e cobriam-se com a bandeira da seleção brasileira, dando a impressão de que estavam prontas para entrar num estádio de futebol e ver o time do Brasil jogar naquela hora. Algumas dessas pessoas, com quem  eu tive a oportunidade de conversar durante a manifestação, viviam em edifícios luxuosos dos bairros grafinos (do Farol da Barra, da Pituba, ou do Caminho das Arvores) da elite baiana, que eram protegidos por guardas de segurança. Intelectual e politicamente, me pareceram pessoas ingênuas, mal informadas ou ignorantes; apenas se revelavam como o que realmente eram: indivíduos pretenciosos, arrogantes e medíocres. Aliás a mediocridade foi a marca registrada da maioria das pessoas de classe media alta que tive oportunidade de conversar em Salvador: era o que acontecia quase diariamente enquanto realizava os exercícios de malhação no ginásio (gim) do edifício onde me hospedava. No geral, essas pessoas me pareciam bem ignorantes: estavam muito mal informadas e colonizadas pela media corporativa nacional e internacional: a Globo TV, Fox news, CNN e muitas outras, que operam no Brasil  para transformar nossa população numa massa de imbecis consumistas, fetichistas, e alienados; dominados pela ideologia do sistema capitalista neoliberal que impera por todo o Brasil.
Em resumo, a impressão que esta viagem pelas cidades do sertão baiano-pernambucano me deixou foi que a realidade brasileira, desde o ponto de vista estrutural, não conseguiu superar a situação de injustiça sócio econômico que foram expressadas pela representação alegórica de Glauber Rocha dentro de duas obras primas do cinema brasileiro: “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “Terra em Transe”.
Quase a mesma coisa poderia dizer em relação a minha percepção do aumento e da proliferação das favelas, da marginalidade social, do trafico de drogas e da criminalidade na cidade de Salvador; a impressão que tudo isso me deixou foi que a realidade brasileira desde o ponto de vista da justiça sócio econômico ainda não pode superar a representação realista de Fernando Meirelles da cidade do Rio de Janeiro, no excelente filme “Cidade de Deus”
            E foi na cidade do Rio de Janeiro onde pude encontrar pela primeira vez o amigo João (Jonga) Carlos Olivieri e sua bonita e querida esposa Virginia.
Quando o avião, procedente de Miami, aterrissou no aeroporto Antônio Carlos Jobim, lá estava o amigo Jonga esperando-me. Ainda que Jonga e eu tivéssemos estado nos comunicando frequentemente através de e-mails e telefonemas EUA-Brasil durante muitos anos, era a primeira vez que nos encontrávamos pessoalmente.
Nesse nosso primeiro encontro, Jonga estava sem a esposa Virginia, e enquanto esperávamos pelo avião que me levaria a cidade de Salvador, Jonga e eu (caminhando ou sentados nas lanchonetes e restaurantes do aeroporto) conversávamos bebendo cafés, chocolates, ou almoçando pra valer.
Quando voltei ao Rio para passar dois dias visitando a cidade, aterrizei no aeroporto Tom Jobim e lá estavam o amigo Jonga e a esposa Virginia  esperando-me. Durante os dois dias que passei no Rio, Jonga e Virginia me receberam com uma grande amizade, com uma solidaria companhia e com uma cálida e tranquila hospedagem
Não posso deixar de expressar meus agradecimentos pela bela hospedagem e companhia que sua amizade me brindou. Durante o pouco tempo que permaneci no Rio., eles me levaram para passear pelas ruas da cidade. Na tarde da minha chegada, me levaram de ônibus e metrô para passear.  Depois de passar pela bela lagoa Rodrigo de Freiras, fomos ao bairro de Copacabana  para caminhar pela rua Nossa Senhora de Copacabana, rever e apreciar a sua famosa praia do mesmo nome, desfrutar a magnifica orla marítima da Avenida Atlântica e contemplar os famosos edifícios e as espetaculares vistas como o panorâmicas (o Corcovado, o Cristo Redentor, o Pão de Açúcar) da “cidade maravilhosa”. O Rio de Janeiro continua lindo. 


No dia seguinte, eles me levaram a passear pelo centro da cidade. Caminhamos pela Avenida Presidente Vargas, pela Cinelândia, pela Avenida Rio Branco, onde pude rever os prédios antigos e famosos tais como a Biblioteca Nacional, o Teatro Municipal, pude desfrutar de cafés, restaurantes e das boas livrarias da cidade.
As 5 da tarde, tomamos um taxi, para chegar ao Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim e abordar o avião da Américan Airlines que me devolveria ao aeroporto internacional de Miami. Sentado, junto aos amigos Jonga e Virginia, no banco do aeroporto, dei-me conta de que ainda tinha na minha carteira, 172 reais que eram equivalentes, naquele momento, a  mais de 40 dólares no cambio oficial.
Sem tempo suficiente para comprar umas lembrançinhas no aeroporto, fui ao Banco  Safra para converter aqueles reais em dólares. Resultado do intercambio naquele dia: o Banco Safra me entregou apenas  25 dólares em troca dos 172 reais. Em poucas palavras, fui roubado e saí do Brasil com a sensação de que nosso país está completamente submetido à ditadura do capital financeiro. Em poucas palavras, o nosso pais está submetido à máfia e a ladroagem oficial dos bancos nacionais e internacionais, produtos  de um sistema sócio econômico capitalista que legitima taxas aterrorizantes de juros  contra o povo brasileiro.
E dentro do avião estadunidense,  que deixava a baia de Guanabara, eu questionava indignado: até quando vamos tolerar que este abominável sistema capitalista continue destruindo o nosso Brasil?


Sunday, October 18, 2015

Novas pensatas: Em busca do espaço/tempo ganho no Brasil, Parte 3





 


 


Em busca do espaço/tempo ganho no Brasil

Texto de Jorge Vital de Brito Moreira 
Parte 3

A viagem pelo nordeste do Brasil, além de ilustrada e informativa, foi, durante a maior parte do tempo, extremamente divertida e muito engraçada;  graças ao talento natural do amigo Israel Pinheiro para saber contar piadas “nacionalistas” e à minha inclinação para replicá-las com piadas alegóricas, nunca fomos vítimas do conhecido “tédio de viagem”. De vez em quando parávamos o carro para comprar água natural, beber água de coco e cerveja gelada, e/ou para almoçar e jantar.
A carne de bode, de carneiro, o requeijão, o queijo de coalho, foram alimentos  que nunca faltaram na viagem. Tampouco faltaram pamonha, cuscuz, bolacha, pão e amendoim cozido, ao lado do mate gaúcho quente chupado pelo Israel no fundo do carro. A comida nordestina então foi outras das maravilhas da nossa viagem.
A viagem também foi muito interessante por contar com a presença do jovem Gabriel Pinheiro, um estudante de advocacia, cuja participação, como piloto, deveu-se a existência de uma greve na Escola de Direito. Gabriel, além de tomar fotos da viagem, transformou-se num ativo interlocutor para as conversas em torno aos temas jurídicos, políticos, sócioeconômicos, culturais e ecológicos; conversas que surgiram enquanto dirigíamos o automóvel.
Depois de chegar, visitar e dormir na cidade de Bomfim, na Bahia, fomos passear pelo antigo prédio do seminário católico onde, muitas décadas antes, o sociólogo Israel Pinheiro estudou para se converter num padre católico. Felizmente, para o bem do Israel, das três famílias, e dos quatro filhos que procriou, a profissão de vigário não frutificou.
 Seguindo na cidade de Bonfim, fomos visitar as antigas (mas conservadas e bonitas) instalações da estrada de ferro da cidade (comprovem vendo a fotografia que Novas Pensatas utilizou para ilustrar o primeiro texto que escrevi sobre esta viagem). Assim, era inevitável que aparecesse frequentemente nas nossas conversas, o tema da estúpida decisão do governo brasileiro de quase extinguir as estradas de ferro e o sistema de transporte ferroviário no Brasil. (comparando o crescimento do Brasil ao da China, deveríamos lembrar que atualmente as ferrovias e os trens de ferro dos chineses conformam um dos sistemas de transporte mais importantes e dinâmicos do mundo contemporâneo, sistema imprescindível para o extraordinário desenvolvimento sócio econômico da poderosa China).
Com tantos diálogos matinais, vespertinos e noturnos, era inevitável que Israel e eu nos lembrássemos do nosso tempo de estudantes universitários e daquelas imprescindíveis discussões da nossa historia nacional, da cultura brasileira e da sociedade contemporânea do país.
Apesar das mudanças ocorridas no Brasil nestes últimos 50 anos (entre o inicio da modernização capitalista conservadora implementada pela ditadura militar em 1964 e a recente crise da hegemonia do PT e seu projeto governista neoliberal), continuo acreditando que a discussão sobre o desenvolvimento e subdesenvolvimento do Brasil como país capitalista emergente (subordinado aos interesses do mercado internacional globalizado e imperialista), deveria ser uma discussão central para a maioria dos brasileiros. Esta discussão, para mim, é um dos requisitos teórico-metodológicos fundamentais para que os políticos, intelectuais, artistas, trabalhadores e estudantes possam entender o maldito papel do imperialismo no problemático destino do Brasil como retrógado exportador de matérias primas e alimentos em pleno século XXI. Em síntese, continuo acreditando (apesar da hegemonia da ideologia neoliberal propagandeada pela mídia corporativa nacional/internacional) que a luta pela integridade da nação brasileira contra os interesses expansionistas do imperialismo dos EUA e internacional, deveria continuar sendo uma das discursões hierarquicamente prioritárias para as novas gerações de brasileiros que ainda desejam ter um país livre e independente da intervenção estrangeira.
Desde meu ponto de vista, é lamentável e indigno que a mentalidade e a opinião da classe média brasileira esteja dominada pela ideologia colonialista dos programas de TV produzidos por canais da mídia corporativa e antidemocrática dos grandes conglomerados como a Globo, CNN, Fox, pelas  revistas Veja e Isto é e por jornais tais  como o Estado de São Paulo e a Folha de São Paulo em prol do modelo neoliberal do imperialismo estadunidense.
Outros dos grandes momentos da travessia em torno do rio São Francisco, foi a nossa decisão de continuar dirigindo o “Peugeot” pelas ótimas estradas do sertão pernambucano: a decisão de sair de Petrolina e fazer a viagem direta para Cabrobó, a cidade onde visitamos as obras de transposição do Rio São Francisco, um projeto empreendido pelo governo federal para o deslocamento de parte de suas águas através de mais de 700 quilómetros de canais de concreto ao longo do território de quatro estados brasileiros (Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte).
Em Cabrobó, tivemos a oportunidade de subir por um gigantesco canal de concreto e logo caminhar por meio quilometro ao longo de uma das suas extensas beiradas para poder observar (!que visão fantástica!), desde o alto da babilônica construção, a planície semi desértica, o rio São Francisco, e o poderosíssimo sistema de máquinas, que era o responsável pelo bombeamento do precioso liquido para o canal de concreto armado. O que nos surpreendeu foi não poder ter visto as máquinas bombeando o liquido, nem ter visto as águas correndo pelo canal de concreto. Assim, perguntamos a um jovem (que percorria numa moto as imensas paredes das beiradas do canal de cimento) se ele sabia a razão da falta de atividade do sistema e da falta de água no canal. Ele então nos explicou que  devido à falta de chuva na Serra da Canastra em Minas Gerais, tinha havido uma grande redução no volume das águas do rio São Francisco; por isso o sistema hidráulico não bombeava água todos os dias da semana, bombeava apenas, esporadicamente, dia sim, dia não.
A explicação dele era lógica e coerente com o que já havíamos presenciado e ouvido nas margens ribeirinhas do “Velho Chico”: tanto na barragem do Sobradinho como nas cidades por onde passamos (Juazeiro, Casa Nova, Remanso) a realidade era a mesma: o nível das águas estava muito baixo. [para os leitores terem uma imagem concreta, informo, que na cidade de Remanso, por exemplo, tivemos de dirigir por uns nove quilômetros (entre a margem anterior e a margem atual) para molhar os pés nas águas do rio]. Nesses momentos, eu lembrava da música (“O sertão vai virar mar e o mar virar sertão”) e das imagens do filme Deus e o Diabo na terra do Sol, a obra prima do genial cineasta baiano Glauber Rocha.
Logo de realizar o segundo dos nossos principais objetivos (conhecer a transposição do Rio São Francisco), partimos no carro para conhecer a cidade, a cachoeira e a usina hidroelétrica de Paulo Afonso. Depois de percorrer esta cidade de norte a sul, de leste a oeste, estivemos contemplando e tirando fotos da paisagem em torno dos milhões de metros cúbicos de água azul da gigantesca barragem. Nosso passeio foi coroado com um banho prolongado numa praia agradável construída pela CHESF numa das margens da represa. Vestidos em shorts de banho, Gabriel e eu, nadávamos e mergulhávamos nas águas barrentas do rio, enquanto Israel, sentado numa barraca de lona, bebia água de coco, tomava cerveja e comia amendoim cozido. À tarde, seguimos para a cidade de Araci, mas, antes de chegar lá, tivemos de fazer uma parada no Jorro (a cidade de águas quentes) porque o Israel queria participar do ritual daquela região: tomar banho quente roçando a pele na pele de inúmeros (dezenas, centenas) banhistas de dentro e fora do local. 
Depois de dormir em Araci (terra onde sou sempre muito bem recebido pelo familiares de Israel) tomei, no feriado do dia 7 de setembro, um ônibus coletivo, para visitar a cidade de Feira de Santana e me encontrar com o grande amigo Nilo Henrique Neves dos Reis (professor de filosofia da UEFS) junto a Sumaya de Oliveira, uma bela e inteligente mulher, que o amigo, sortudo, me apresentou como sendo sua esposa. Sumaya, além de ser uma apaixonada promotora pública na região é também uma educadíssima anfitriã soteropolitana.
Agora também devo mencionar que, além da amizade e das excelentes qualidades humanas e executivas (inteligência, generosidade, liderança) que Nilo sempre revelou, ele também foi o principal responsável pela edição, publicação, e lançamento do meu livro “Memorial da Ilha e Outras Ficções” na cidade de Feira de Santana, a princesa do sertão baiano.
No final da tarde, tomei o ônibus de 5:30 na rodoviária de Feira esperando chegar a cidade de Salvador entre 6:00 e 7:00 da noite. A dura realidade (do transito entre as duas cidades) é que só pude chegar na residência da minha irmã Lúcia, no bairro da Pituba, em Salvador, às 11:00 horas da noite: uma realidade comparável ao filme Weekend, um filme de ficção do genial cineasta francês, Jean Luc-Godard.
Em Salvador, pude então reencontrar, o meu irmão mais moço, Carlos Roberto (Carlinhos) para empreender uma segunda viagem. Desta vez, a viagem seria realizada por ferry-boat e por automóvel através da Ilha de Itaparica, o espaço-tempo onde a nossa mãe nasceu e onde a nossa família passava as férias durante o verão baiano.

(Continua na próxima semana)